BALADA DO MEDO
Eram quatro cavalos de
silêncio negro.
Quatro esporas ferindo
as éguas do canto.
Quatro asas de fumo
sobre o pensamento.
Quatro sombras de medo
à volta da casa.
Eram quatro nomes. E
quatro navalhas.
Eram quatro paredes. E
quatro guardas.
Eram quatro assassinos.
E quatro espingardas.
Eram quatro sorrisos. E
quatro canalhas.
Eram quatro. Eram
quatro. E o meu peito batia.
Quatro lanças no
sangue. Quatro gritos na voz.
Quatro lenços de vento.
Quatro rosas tardias.
Eram quatro forcas.
Eram quatro nós.
Eram quatro letras com
rasto de lume.
Quatro olhos acesos na
boca da noite.
Quatro harpas cantando
a hora de um crime.
Eram quatro farpas.
Eram quatro açoites.
Quatro balas. Quatro.
Eram quatro, sim.
Eram quatro servos. E
quatro chicotes.
Eram quatro cabeças. E
quatro garrotes.
Eram sempre quatro os
gritos que ouvi.
Quatro rosas negras.
Quatro armas brancas.
Quatro luas velhas.
Quatro aves de sono.
Quatro feridas sujas.
Quatro hienas mortas.
Eram quatro lobos.
Quatro cães sem dono.
Eram quatro. Eram
quatro. Agora me lembro
das vozes gritando ao
longo do tejo.
Eram quatro gaivotas no
céu de Novembro.
Quatro mãos em sangue
que agora não vejo.
Eram quatro copos. Eram
quatro taças.
Eram quatro algemas.
Eram quatro espadas.
Eram quatro pombas
quase esfaceladas.
Eram quatro risos. E
quatro desgraças.
Eram quatro, sim. Eram
sempre quatro
as feridas abertas na
palma da mão.
Eram quatro janelas
fechadas no quarto.
Eram quatro loucos com
olhos de cão.
Eram quatro tempos num
tempo de medo.
Eram quatro, eram, as
larvas do tédio.
Eram quatro mortes
todas em segredo.
Eram quatro vidas todas
sem remédio.
Foram sempre quatro as
lutas que eu tive
com quatro cavalos qual
deles o mais forte.
Quatro razões certas
por quem um homem vive
sem temer os quatro
cavalos da morte.
JOAQUIM PESSOA,
in “125 poemas -
Antologia poética”
Voz:
João Morgado
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