quarta-feira, julho 30, 2014
PELA NOITE, COM ANTÓNIO NOBRE: "O TEU RETRATO"
O
TEU RETRATO
Deus
fez a noite com o teu olhar,
Deus
fez as ondas com os teus cabelos;
Com
a tua coragem fez castelos
Que
pôs, como defesa, à beira-mar.
Com
um sorriso teu, fez o luar
(Que
é sorriso de noite, ao viandante)
E
eu que andava pelo mundo, errante,
Já
não ando perdido em alto-mar!
Do
céu de Portugal fez a tua alma!
E
ao ver-te sempre assim, tão pura e calma.
Da
minha Noite, eu fiz a Claridade!
Ó
meu anjo de luz e de esperança,
Será
em ti afinal que descansa
O
triste fim da minha mocidade!
ANTÓNIO NOBRE
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POEMAS SOLTOS- O Teu Retrato. António Nobre.
UMA TARDE COM MANUEL ALEGRE: "COISA AMAR"
COISA AMAR
Contar-te longamente as
perigosas
coisas do mar. Contar-te o amor
ardente
e as ilhas que só há no verbo
amar.
Contar-te longamente
longamente.
Amor ardente. Amor ardente. E
mar.
Contar-te longamente as
misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas
perigosas.
Contar-te longamente que já foi
num tempo doce coisa amar. E
mar.
Contar-te longamente como dói
desembarcar nas ilhas misteriosas.
Contar-te o mar ardente e o
verbo amar.
E longamente as coisas
perigosas.
MANUEL ALEGRE,
in COISA AMAR (COISAS DO MAR),
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POEMAS SOLTOS- Coisa Amar. Manuel Alegre.
domingo, julho 27, 2014
À NOITINHA, COM DAVID MOURÃO-FERREIRA: "PENÉLOPE"
PENÉLOPE
Mais do que um sonho: comoção!
Sinto-me tonto, enternecido,
quando, de noite, as minhas
mãos
são o teu único vestido.
E recompões com essa veste
que eu, sem saber, tinha
tecido,
todo o pudor que desfizeste
como uma teia sem sentido;
todo o pudor que desfizeste
a meu pedido.
Mas nesse manto que desfias,
e que depois voltas a pôr,
eu reconheço os melhores dias
do nosso amor.
DAVID MOURÃO-FERREIRA
sábado, julho 26, 2014
PELA NOITE ...Com ÁLVARO DE CAMPOS (Heterónimo de Fernando Pessoa)
Há sem dúvida quem ame o
infinito,
Há sem dúvida quem deseje o
impossível,
Há sem dúvida quem não queira
nada —
Três tipos de idealistas, e eu
nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o
finito,
Porque eu desejo
impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco
mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
ÁLVARO DE CAMPOS
(Heterónimo de Fernado Pessoa)
quarta-feira, julho 23, 2014
À TARDINHA COM JORGE DE SENA: "NO PAÍS DOS SACANAS"
NO PAÍS DOS SACANAS
Que adianta dizer-se que é um
país de sacanas?
Todos os são, mesmo os
melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se
saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma
sacanice
para poder funcionar
fraternalmente
a humidade de próstata ou das
glandulas lacrimais,
para além das rivalidades,
invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e
afinal se irmanam.
Dizer-se que é de heróis e
santos o país,
a ver se se convencem e puxam
para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe
que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que
foram disso?
Não, o melhor seria aguentar,
fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam
que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas,
ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a
independência, a
justiça, a bondade, etc., etc.,
sejam
outra coisa que não patifaria
de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são
capazes de atingir.
No país dos sacanas, ser sacana
e meio?
Não, que toda a gente já é e
pelo menos dois.
Como ser-se então nesse país?
Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão,
dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro, e o
gajo morreu na mesma.
JORGE DE SENA
10/10/1973
PROJETO "YOSEMITE" de Colin Delehanty e Sheldon Neill
Colin Delehanty e Sheldon Neill, ambos apaixonados pela
fotografia, quando se conheceram através da plataforma de partilha de vídeos
Vimeo, estavam longe de imaginar
que iriam desenvolver este projeto
intitulado "Yosemite".
Os dois fotógrafos,
decidiram após uma partilha de ideias
relativas à sua paixão comum, a fotografia, que iriam em conjunto captar
as magnificas paisagens que o
"Yosemite National Park" oferece.
Neste Projeto
captaram diversas imagens do parque nacional de Yosemite através de uma Canon
5D Mark II e uma variedade de lentes Canon L e Zeiss CP, criando os vídeos inseridos nesta mensagem, e
que através da utilização da técnica Timelapse
quase nos dão a ilusão de que podemos tocar as paisagens através do
ecrã.
Yosemite
atrai entre 3 e 4 milhões de visitantes por ano, visitado pela maioria das
pessoas durante o mês de julho.
Quando
as temperaturas são mais baixas e o clima é claro, escaladores inundam o vale
para escalar as suas paredes de granito de 3000 pés...
Informações retiradas de: Project Yosemite
Vídeo obtido em: Project Yosemite on Vimeo
segunda-feira, julho 21, 2014
PELA NOITE, COM MIA COUTO: "SOLIDÃO"
SOLIDÃO
Aproximo-me da noite
o silêncio abre os seus panos escuros
e as coisas escorrem
por óleo frio e espesso
Esta deveria ser a hora
em que me recolheria
como um poente
no bater do teu peito
mas a solidão
entra pelos meus vidros
e nas suas enlutadas mãos
solto o meu delírio
É então que surges
com teus passos de menina
os teus sonhos arrumados
como duas tranças nas tuas costas
guiando-me por corredores infinitos
e regressando aos espelhos
onde a vida te encarou
Mas os ruídos da noite
trazem a sua esponja silenciosa
e sem luz e sem tinta
o meu sonho resigna
MIA COUTO,
in
"Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
Etiquetas:
POEMAS SOLTOS-Solidão. Mia Couto.
MESTRE BAGUINHO, O SAPATEIRO POETA DA MOURARIA
A nossa Lisboa tem surpreende-nos em cada momento. E esta é mais uma das suas surpresas deliciosas.
Em pleno bairro da Mouraria, mais precisamente no número 50 da rua dos Lagares, Fernando Baguinho, de 80 anos feitos no Dia de Portugal, exerce a sua profissão desde os 8 anos. A sua vida seria um mote constante para um mais um fado deste bairro. A tristeza, morte e miséria perseguiram-no sempre desde a mais tenra idade, mas também lhe deram forças para se erguer na vida e vencer na sua profissão.
«Fui aprender a profissão num vão de escada da Av. Almirante Reis, como moço de recados. Foram tempos muito duros, e só não morremos de fome, graças à sopa dos amigos. Levava todos os dias uma chapinha de metal para trazer sopa e pão para a famíla. Era a única coisa que comíamos durante o dia. Era só eu que trabalhava. Naquela altura, ganhava 15 tostões por dia e 9 escudos por semana»
O discurso é interrompido pela chegada de um velho amigo António, que lhe foi meter o boletim para do euromilhões neste espaço mágico, a loja de Fernando Baguinho. A esperança é a última a morrer.
A loja lembra uma casa-museu, onde Lisboa Antiga permanece intocável e firme no tempo, com as suas molduras, quadros e gravuras de gentes e espaços que outrora deram vida a esta cidade. Todos eles feitos com recortes de papel e cola de sapateiro, ilustrados com quadras e frases suas:
"SAPATEIROS"
Os catedráticos das profissões
Candidatos ao Prémio Nobel
Têm fama de aldrabões
Mentirosos e sucateiros
Mas quais são as profissões
Que não têm sapateiros"
Baguinho, uma alcunha que lhe deram
por ser pequenino, adora Lisboa e o bairro que o viu crescer.
Mestre Baguinho, um sapateiro poeta da Mouraria, a trabalhar
"até quando Deus quiser"...
sábado, julho 19, 2014
sexta-feira, julho 18, 2014
NESTA NOITE,COM NELSON MANDELA.-Poema:INVICTUS (William E. Henley)
INVICTUS
Do fundo desta noite que
persiste
A me envolver em breu - eterno
e espesso,
A qualquer deus - se algum
acaso existe,
Por mi’alma insubjugável
agradeço.
Nas garras do destino e seus
estragos,
Sob os golpes que o acaso atira
e acerta,
Nunca me lamentei - e ainda
trago
Minha cabeça - embora em sangue
- ereta.
Além deste oceano de lamúria,
Somente o Horror das trevas se
divisa;
Porém o tempo, a consumir-se em
fúria,
Não me amedronta, nem me
martiriza.
Por ser estreita a senda - eu
não declino,
Nem por pesada a mão que o
mundo espalma;
Eu sou dono e senhor de meu
destino;
Eu sou o comandante de minha
alma.
William E. Henley
(Tradutor: André C S Masini)
Com esta mensagem, presto , neste dia, uma homenagem singela a quem foi um dos maiores homens de sempre. Nelson Mandela.
Com esta mensagem, presto , neste dia, uma homenagem singela a quem foi um dos maiores homens de sempre. Nelson Mandela.
PELA MANHÃ, COM VINICIUS DE MORAES: "A UM PASSARINHO"
A
UM PASSARINHO
Para
que vieste
Na
minha janela
Meter
o nariz?
Se
foi por um verso
Não
sou mais poeta
Ando
tão feliz!
Se
é para uma prosa
Não
sou Anchieta
Nem
venho de Assis
Deixe-te
de histórias
Some-te
daqui.
VINICIUS
DE MORAES
quinta-feira, julho 17, 2014
BOA NOITE. COM MANUEL BANDEIRA : "A ESTRELA"
A
ESTRELA
Vi
uma estrela tão alta,
Vi
uma estrela tão fria!
Vi
uma estrela luzindo
Na
minha vida vazia.
Era
uma estrela tão alta!
Era
uma estrela tão fria!
Era
uma estrela sozinha
Luzindo
no fim do dia.
Por
que da sua distância
Para
a minha companhia
Não
baixava aquela estrela?
Por
que tão alta luzia?
E
ouvi-a na sombra funda
Responder
que assim fazia
Para
dar uma esperança
Mais
triste ao fim do meu dia.
MANUEL BANDEIRA
(1886/04/19
- 1968/10/13
Brasil)
Etiquetas:
POEMAS SOLTOS-A Estrela. Manuel Bandeira.
terça-feira, julho 15, 2014
O QUE VERDADEIRAMENTE MATA PORTUGAL - O pensamento de Eça de Queiroz (1845-1900)
O que verdadeiramente nos mata,
o que torna esta conjuntura inquietadora, cheia de angústia, estrelada de luzes
negras, quase lutuosa, é a desconfiança. O povo, simples e bom, não confia nos
homens que hoje tão espectaculosamente estão meneando a púrpura de ministros;
os ministros não confiam no parlamento, apesar de o trazerem amaciado,
acalentado com todas as doces cantigas de empregos, rendosas conezias, pingues
sinecuras; os eleitores não confiam nos seus mandatários, porque lhes bradam em
vão: «Sede honrados», e vêem-nos apesar disso adormecidos no seio ministerial;
os homens da oposição não confiam uns nos outros e vão para o ataque, deitando
uns aos outros, combatentes amigos, um turvo olhar de ameaça. Esta desconfiança
perpétua leva à confusão e à indiferença. O estado de expectativa e de demora
cansa os espíritos. Não se pressentem soluções nem resultados definitivos:
grandes torneios de palavras, discussões aparatosas e sonoras; o país, vendo os
mesmos homens pisarem o solo político, os mesmos ameaços de fisco, a mesma
gradativa decadência. A política, sem actos, sem factos, sem resultados, é
estéril e adormecedora.
Quando numa crise se protraem
as discussões, as análises reflectidas, as lentas cogitações, o povo não tem
garantias de melhoramento nem o país esperanças de salvação. Nós não somos
impacientes. Sabemos que o nosso estado financeiro não se resolve em bem da
pátria no espaço de quarenta horas. Sabemos que um deficit arreigado,
inoculado, que é um vício nacional, que foi criado em muitos anos, só em muitos
anos será destruído.
O que nos magoa é ver que só há
energia e actividade para aqueles actos que nos vão empobrecer e aniquilar; que
só há repouso, moleza, sono beatífico, para aquelas medidas fecundas que podiam
vir adoçar a aspereza do caminho.
Trata-se de votar impostos?
Todo o mundo se agita, os governos preparam relatórios longos, eruditos e de
aprimorada forma; os seus áulicos afiam a lâmina reluzente da sua argumentação
para cortar os obstáculos eriçados: as maiorias dispõem-se em concílios para
jurar a uniformidade servil do voto. Trata-se dum projecto de reforma
económica, duma despesa a eliminar, dum bom melhoramento a consolidar? Começam
as discussões, crescendo em sonoridade e em lentidão, começam as argumentações
arrastadas, frouxas, que se estendem por meses, que se prendem a todo o
incidente e a toda a sorte de explicação frívola, e duram assim uma eternidade
ministerial, imensas e diáfanas.
O país, que tem visto mil vezes
a repetição desta dolorosa comédia, está cansado: o poder anda num certo grupo
de homens privilegiados, que investiram aquele sacerdócio e que a ninguém mais
cedem as insígnias e o segredo dos oráculos. Repetimos as palavras que há pouco
Ricasoli dizia no parlamento italiano: «A pátria está fatigada de discussões
estéreis, da fraqueza dos governos, da perpétua mudança de pessoas e de
programas novos.»
Eça de Queirós,
in ‘Distrito de
Évora’
O pensamento de Eça de Queiroz (1845-1900)
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