quinta-feira, julho 09, 2015

FLORIRAM POR ENGANO AS ROSAS BRAVAS (CAMILO PESSANHA)- Uma pequena homenagem, a uma grande mulher: Maria Barroso (1925-2015)






FLORIRAM POR ENGANO AS ROSAS BRAVAS



Floriram por engano as rosas bravas
No inverno: veio o vento desfolhá-las...
Em que cismas, meu bem? Porque me calas
As vozes com que há pouco me enganavas?
Castelos doidos! Tão cedo caístes!...
Onde vamos, alheio o pensamento,
De mãos dadas? Teus olhos, que um momento
Perscrutaram nos meus, como vão tristes!
E sobre nós cai nupcial a neve,
Surda, em triunfo, pétalas, de leve
Juncando o chão, na acrópole de gelos...
Em redor do teu vulto é como um véu!
Quem as esparze _quanta flor! _do céu,
Sobre nós dois, sobre os nossos cabelos?



CAMILO PESSANHA,
in “Clépsidra”



Camilo de Almeida Pessanha foi um poeta português. Nasceu a 7 de setembro de 1867 em Coimbra, e morreu a 1 de março de 1926 em Macau, República Popular da China. É considerado o expoente máximo do simbolismo em língua portuguesa, além de antecipador do princípio modernista da fragmentação.
Duas imagens são aqui visualizadas:a Rosa, símbolo da máxima fragilidade, e os Castelos doidos, metáfora dos desejos tomados como realidades. Surge também outra expressão com dimensão simbólica: mãos dadas-união que é negada pela expressão alheio o pensamento. Esta desunião, este mútuo alheamento, são confirmados pelo desencontro de olhares (brevidade da conjugação de olhares: um momento). Talvez por causa desse breve encontro tivessem florido as rosas, mas por engano...O vento desfolhou-as logo, isto é, a vida desfaz o que é frágil, o sonho , a ilusão


Este poema constitui uma justa  e simples homenagem à dra. Maria de Jesus Barroso, que tão recentemente nos deixou. Foi o poema por ela escolhido e enviado a seu marido, dr. Mário Soares, quando este se encontrava preso na prisão do Aljube.






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