CLARIDADE
De
minha vida não sei
senão
que sou feliz.
Lá
o que fui ou fiz
antes
de ser o que sou,
ai!,
tudo me passou:
só
sei que sou feliz.
E
que me importa a cor
das
águas que passaram?
Estas
águas me bastam
que
vão correndo agora.
Fosse
o que fosse, a minha
passada
vida incerta
(feliz
ou desgraçada),
foi
uma porta aberta
pra
esta vida clara.
Por
isso eu a bendigo,
a
minha vida ida.
Talvez
as rosas nela
tivessem
bem mais cor,
o
Sol mais Luz e Amor,
e
música mais bela
a
viração, então;
mais
verde fosse o Mar...
-
Mas que vale o que foi,
se,
quanto vejo ou provo,
tem
tudo um gosto novo?...
Se
nada cansa ou dói?...
Se
as rosas, para mim,
nasceram
mesmo agora,
e
as aves e o Mar?...
Se
o Sol aconteceu
ao
mesmo tempo que eu
olhei
à minha roda
e
vi o meu presente
a
ser-me a vida toda?...
SEBASTIÃO DA GAMA
Sebastião da Gama, poeta português, era natural de Vila Nogueira de Azeitão, Setúbal. Concluiu o curso de Filologia
Românica na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1947, e ainda
nesse ano iniciou a sua actividade de professor, que exerceu em Lisboa, Setúbal
e Estremoz. Foi colaborador das revistas Árvore e Távola Redonda.
Sebastião da Gama ficou para a história pela sua dimensão
humana, nomeadamente no convívio com os alunos, registado nas páginas do seu
famoso Diário (iniciado em 1949).
Literariamente, não esteve dependente de qualquer escola, afirmando-se pela sua
temática (amor à natureza, ao ser humano) e pela candura muito pessoal que
caracterizou os seus textos. Atingido pela tuberculose, que causaria a sua
morte precoce, passou a residir no Portinho da Arrábida, com a panorâmica serra
da Arrábida a alimentar o culto pela paisagem presente na sua obra. Foi,
entretanto, instituído, com o seu nome, um Prémio Nacional de Poesia.
Estreou-se com Serra Mãe, em 1945. Publicou ainda Loas
a Nossa Senhora da Arrábida (1946, em colaboração com Miguel Caleiro), Cabo da
Boa Esperança (1947) e Campo Aberto (1951). Após a sua morte, foram editados
Pelo Sonho é que Vamos (1953), Diário (1958), Itinerário Paralelo (1967), O
Segredo é Amar (1969) e Cartas .
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