DÁ-ME LÍRIOS, LÍRIOS
Dá-me lírios, lírios
E rosas também
Dá-me rosas, rosas,
E lírios também,
Crisântemos, dálias,
Violetas e os girassóis,
Acima de todas as flores.
Deita-me às mãos cheias,
Por cima da alma,
Dá-me rosas, rosas,
E lírios também...
Meu coração chora
Na sombra dos parques,
Não tem quem o console,
Verdadeiramente,
Excepto a própria sombra dos parques
Entrando-me na alma,
Através do pranto
Dá-me rosas, rosas
E lírios também,
Minha dor é velha,
Como frasco de essência cheio de pó
Minha dor é inútil
Como uma gaiola de uma terra onde não há aves
E a minha dor é silenciosa e triste,
Como a parte da praia onde o mar não chega,
Chego às janelas
dos palácios arruinados,
E cismo de dentro para fora,
Para me consolar do presente
Dá-me rosas, rosas,
E lírios também...
Mas por mais rosas e lírios que me dês,
E nunca acharei que a vida é bastante,
Faltar-me-á sempre qualquer coisa,
Sobrar-me-á sempre de que desejar,
Como um pássaro deserto.
Por isso, não te importes com o que penso,
E muito embora o que eu te peça
Te pareça que não quer dizer nada,
Minha pobre criança tísica,
Dá-me das tuas rosas e dos teus lírios,
Dá-me rosas, rosas,
E lírios também...
ÁVARO DE CAMPOS
(het.FERNANDO PESSOA),
Poesias, pág.40
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