Morreu o sorriso da
União Soviética. Aos oitenta e sete anos, o palhaço profissional com mais anos
de atividade ainda andava em tournée pelo Sudoeste russo. O coração parou
enquanto via televisão. Consta que terá morrido sem dor, sentado numa poltrona
na quarta-feira da semana passada. Foi enterrado na Alemanha, onde estabeleceu
residência desde a queda do Muro de Berlim, no final nos anos oitenta.
Oleg Konstantinovich
Popov nasceu na antiga União Soviética no ano de 1930. Os seus pais não tinham
qualquer atividade relacionada com o circo ou o entretenimento, eram uma
família algo humilde.
Oleg Popov |
Aos catorze anos, Oleg
entrou na escola de circo de Moscovo e iniciou-se em truques de malabarismo e
em equilibrismo na corda. Após cinco anos de aprendizagem intensiva, o
jovem Oleg foi recrutado para a companhia de circo do Estado e a sua carreira
começa. Em 1954, o palhaço que fazia de cabeça de cartaz da companhia sofreu
uma lesão no braço e Popov tomou o seu lugar, nunca mais o largando até ao segundo
dia deste novembro de 2016.
Em 1956, foi a cara de
uma tournée internacional da companhia de circo estatal: a primeira viagem
além-fronteiras, que visava levar ao resto do mundo uma imagem menos cinzenta
do regime soviético. O pontual espírito de abertura sucedeu-se durante o
período de liderança de Nikita Khrushchev.
O destino foi a Europa Ocidental. As
idas ao estrangeiro foram-se propagando e o protagonismo de Popov crescendo. O
facto de o público russo preferir o entretenimento com animais e as plateias a
Oeste darem prioridade a artistas como ele, terá contribuído para a sua
ascensão no meio circense. Ainda o facto de o circo ter uma atividade altamente
profissionalizada na Rússia, com formação desde tenra idade, e, à época, ser
apenas um ofício familiar ou amador em França e Inglaterra, também fizeram de
Popov uma exceção.
Oleg Popov foi, neste
sentido, o embaixador mais sorridente da história da URSS, sendo estrela de
companhia durante mais de três décadas consecutivas e recebendo a mais alta
distinção cultural da União Soviética, a medalha de ‘Artista do Povo’, em 1969.
O seu estilo era
marcado pela naturalidade cómica, pouco eufórica e quase dócil, como se nos
conquistasse sem imposição. Tornou-se uma referência para arte circense, até
aos dias de hoje.
A personagem de Popov,
o seu palhaço-tipo, de peruca loira despenteada e nariz vermelho, mitificou-se.
Popov era capaz de acrobacias, equilibrismos, malabarismos e mimíca. Esta
última era a sua especialidade.
O atual ministro da
Cultura russo apresentou as suas condolências em comunicado oficial,
considerando que Popov «havia conseguido criar esta imagem única de um palhaço
excêntrico, capaz de iluminar (o circo) aparecendo apenas uma vez. Cada uma de
suas atuações era uma festa».
Teresa Ricou, grande
impulsionadora da escola Chapitô, foi uma das últimas pessoas a encontrar-se
com Popov:
«Foi um grande
contributo para o mundo do espetáculo de circo. Privei e participei muito com
ele desde há cinquenta anos. Era um grande homem da comédia, do humor e do
circo, do mundo dos palhaços, que é uma profissão», palavras da própria Ricou.
«Era também um artista muito completo na sua performance. Simbolizava uma velha
escola em que um palhaço tem que ter uma grande diversidade de técnicas. Nessa
velha escola, da União Soviética, era uma última luz que vai ser díficil de
reencontrar: não há muitos mais como ele e é uma enorme perda. A sua última
graça era ter pintado o mindinho de uma mão para assinalar qual era a mão
esquerda. Tomámos uma bebida há pouco tempo na Alemanha e estava ótimo», lamentou.
O espetáculo mais popular
do seu início de carreira, começava com
Popov numa tentativa de apanhar raios de
sol. O gesto valeu-lhe o cognome de ‘Sunshine clown’ por parte da imprensa.
Desde a semana passada, o circo perdeu o seu maior palhaço. E o mundo ficou com menos luz, um
raio de sol.
Descanse em paz.
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