quarta-feira, julho 26, 2017

O FADO CELEBRA-SE HOJE, NO DIA DO 197.º ANIVERSÁRIO DA MORTE DE MARIA SEVERA




FADO MARIA SEVERA


Num beco da mouraria,
Onde a alegria
Do sol não vem
Morreu maria severa
Sabem quem era
Talvez ninguém

Uma voz sentida e quente
Que hoje à terra disse adeus
Voz sentida, mas ardente
Mas que vive eternamente
Dentro em nós e junto a deus
Além nos céus

Bem longe o luar
No azul tem mais luz
Eu vejo-a rezar
Aos pés de uma cruz
Guitarras trinai
Viradas ao céu
Fadistas chorai
Porque ela morreu

Caía a noite na viela
Quando o olhar dela
Deixou de olhar
Partiu p'ra sempre, vencida
Cantando a vida
Que a fez chorar

Deixa um filho idolatrado
Que outro afeto igual não tem
Chama-se ele o triste fado
Que vai ser desse enjeitado?
Se perdeu o maior bem:


O amor de mãe


Maria Severa Onofriana ( 26 Julho, 1820 - 30 Novembro, 1846 ) celebrizou-se como "Severa", tornada o ícone de primeira fadista pelos seus amores e pelos fados que cantava, tocava e dançava, no bairro da Mouraria.
Através do seu registo de batismo a 12 de Setembro de 1820, na Paróquia dos Anjos, registou-se a data de nascimento de Maria Severa Onofriana a 26 de Julho de 1820, o local do seu nascimento terá sido na Rua da Madragoa (actual Rua Vicente Borga nº33), onde sua mãe tinha uma taberna. Filha de Severo Manuel de Sousa, natural da freguesia de S. Nicolau, em Santarém, e de Ana Gertrudes, nascida em Portalegre. O casal havia contraído matrimónio a 27 de Abril de 1815, na Paróquia de Santa Cruz da Prideira de Santarém.

 Maria Severa faleceu muito jovem. O assento de óbito indica a sua morte no dia 30 de Novembro de 1846 na Rua do Capelão, apoplética e sem sacramentos, com a idade de 26 anos e solteira. A fadista foi sepultada no Cemitério do Alto de S. João.
Para além destes dados pouco mais está comprovado sobre a vida da cantadeira, uma vez que a maioria das informações provém dos reduzidos relatos orais de contemporâneos, casos de Luís Augusto Palmeirim, Miguel Queriol e Raimundo António de Bulhão Pato.
O poeta Bulhão Pato, que a conheceu pessoalmente, deixou o seguinte testemunho da sua personalidade: "A pobre rapariga foi uma fadista interessantíssima como nunca a Mouraria tornará a ter!... Não será fácil aparecer outra Severa altiva e impetuosa, tão generosa como pronta a partir a cara a qualquer que lhe fizesse uma tratantada! Valente, cheia de afetos para os que estimava, assim como era rude para com os inimigos. Não era mulher vulgar, pode ter a certeza"

Por seu lado, Luís Augusto Palmeirim confessa que viu e falou com Severa apenas uma vez, mas que "foi o bastante para nunca mais me esquecer da esbelta rapariga, que tinha lume nos olhos, uma voz plangente e sonora, e, apesar destas aparentes seduções, uns modos bruscos e sacudidos, que avisavam os seus interlocutores a porem-se fora do alcance «de um revés de fortuna»".

Tendo-a visitado numa casa onde então morava, no Bairro Alto, descreveu posteriormente, no seu livro "Os excêntricos do meu tempo", esta visita da seguinte forma: "Quando entrei em casa da Severa, modesta habitação do tipo vulgar das que habitam as infelizes sua congéneres, estava ela fumando, recostada num canapé de palhinha, com chinelas de polimento ponteadas de retrós vermelho, com um lenço de seda de ramagens na cabeça e as mangas do vestido arregaçadas até ao cotovelo.

Era uma mulher sobre o trigueiro, magra, nervosa, e notável por uns magníficos olhos peninsulares. Em cima de uma mesa de jogo estava pousada uma guitarra, a companheira inseparável dos seus triunfos; e pendente da parede (sacrilégio vulgar nas casas daquela ordem) uma péssima gravura, representando o Senhor dos Passos da Graça!"

Maria Severa Onofriana, celebrizou-se como "Severa", tornada o ícone de primeira fadista pelos seus amores e pelos fados que cantava, tocava e dançava, no bairro da Mouraria.
Os locais de atuação de Severa não estão ainda identificados, mas acredita-se que estão relacionados com os circuitos de prostituição, em particular do Bairro Alto e da Mouraria.
Severa fez também apresentações em festas aristocráticas, facto tornado possível pela sua ligação ao conde de Vimioso, descrição presente no relato de Miguel Queriol no jornal "O Popular", onde relata a apresentação de Severa no Palácio do Conde.

A estes locais acrescenta o café do antigo moço de forcado Joaquim Silva, à Rua do Saco, nas proximidades da praça de touros do Campo de Santana, onde o Conde de Vimioso se juntava com apreciadores e praticantes da arte de tourear

A popularidade de Severa resultou em larga parte da sua relação amorosa com o Conde de Vimioso, D. Francisco de Paula Portugal e Castro, que lhe proporcionou grande celebridade e naturalmente permitiu a Severa um maior prestígio e número de oportunidades para se exibir para um público de jovens oriundos da elite social e intelectual portuguesa.

Após a sua morte a "meio-soprano dos conservatórios do vício", conforme a apelidou Pinto de Carvalho, passou a usufruir de uma crescente fama, até então inédita nestes círculos populares, cantada em letras de fados, em romance e até no cinema. Essa popularidade está patente no "Fado da Severa", catalogado por Teófilo Braga no "Cancioneiro Popular" de1867, como sendo de autoria de Sousa do Casacão e datado de 1848, de que aqui transcrevemos algumas quadras.

Prolonga-se até hoje a aura de mistério que torna Severa na figura mais mitológica do universo fadista, fruto da ausência de detalhes sobre a sua vida, bem como da inexistência de um retrato que comprovadamente possa perpetuar a sua figura.

Na Mouraria, na Rua do Capelão, está o Largo da Severa, onde a casa da fadista está assinalada com a indicação de “Casa da Severa” e no chão, empedrado de calçada à portuguesa, pode ver-se o desenho de uma guitarra. Na fachada da casa foi colocada uma placa, onde pode ler-se: “Nesta casa viveu Maria Severa Onofriana, considerada na época a expressão sublime do Fado. Faleceu em 30-11-1846 com 26 anos de idade. Lisboa 3-6-89”.
Esta placa foi descerrada por Amália Rodrigues, ao mesmo tempo que dedicada a Fernando Maurício.





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