JOSÉ
E agora,
José?
A festa
acabou,
a luz
apagou,
o povo
sumiu,
a noite
esfriou,
e agora,
José?
e agora,
Você?
Você que é
sem nome,
que zomba
dos outros,
Você que faz
versos,
que ama,
protesta?
e agora,
José?
Está sem
mulher,
está sem
discurso,
está sem
carinho,
já não pode
beber,
já não pode
fumar,
cuspir já
não pode,
a noite
esfriou,
o dia não
veio,
o bonde não
veio,
o riso não
veio,
não veio a
utopia
e tudo
acabou
e tudo fugiu
e tudo
mofou,
e agora,
José?
E agora,
José?
sua doce
palavra,
seu instante
de febre,
sua gula e
jejum,
sua
biblioteca,
sua lavra de
ouro,
seu terno de
vidro,
sua
incoerência,
seu ódio, -
e agora?
Com a chave
na mão
quer abrir a
porta,
não existe
porta;
quer morrer
no mar,
mas o mar
secou;
quer ir para
Minas,
Minas não há
mais.
José, e
agora?
Se você
gritasse,
se você
gemesse,
se você
tocasse,
a valsa
vienense,
se você
dormisse,
se você
cansasse,
se você
morresse....
Mas você não
morre,
você é duro,
José!
Sozinho no
escuro
qual
bicho-do-mato,
sem
teogonia,
sem parede
nua
para se
encostar,
sem cavalo
preto
que fuja do
galope,
você marcha,
José!
José, para
onde?
CARLOS
DRUMMOND DE ANDRADE
Carlos
Drummond de Andrade nasceu a 31 Outubro 1902 (Itabira do Mato Dentro, Minas
Gerais, Brasil) e morreu a 17 Agosto 1987 (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
Brasil).
Foi um poeta, contista e cronista brasileiro,
considerado hoje, talvez o mais influente poeta brasileiro do século XX.
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