HÁ MUITOS TIPOS DE CORAÇÕES...
Há corações que
são como casas antigas, cheios de mistérios e fantasmas, com jardins secretos e
sótãos poeirentos, carregados de memórias e recordações e há corações simples e
fáceis de conhecer, descontraídos e leves, sempre em férias como tendas de campismo.
Há corações viajantes, temerários e corajosos, como barcos à vela que nos
parecem bonitos ao longe, mas que nos deixam sempre na boca o sabor amargo de
nunca os conseguirmos abarcar... Há corações missionários, despojados e
enormes. Há corações que são paquetes de luxo, onde o requinte é a
palavra-chave para baterem... Há corações que são como borboletas e voam de um
lado para o outro sem parar, numa pressa ansiosa de viver tudo antes que a vida
se acabe.
Há corações que
são como elefantes do zoo, muito grandes, pacíficos e passivos que aceitam
viver limitados pelos outros e que até tocam o sino se os tratarmos bem e lhes
dermos mimos e corações aventureiros, sempre prontos para partir em difíceis
expedições e se ultrapassarem a si mesmos. Há corações rebeldes e selvagens que
não suportam laços nem correntes, corações que correm tão depressa como chitas
e matam como leoas, e depois há corações gnus, que sabem que vão ser caçados
mas não fogem ao seu destino...
Há corações
incondicionais que vivem tão maravilhados em descobrir a grandeza de outros
corações que às vezes se esquecem de si próprios... Há corações estrategas, que
batem ao ritmo de esquemas e planos, corações transgressores que vivem para
amar clandestinamente e só sabem desejar o proibido e corações conservadores,
que só se entregam quando tudo é de acordo com os seus padrões e valores.
Há corações a
motor, que vivem só para o trabalho e corações poetas só se alimentam de sonhos
e ilusões. Há corações teatrais, para quem a vida é uma comédia ou uma tragédia
e corações cinéfilos que registam a beleza de cada momento em frames de paixão.
Há corações
duros como aço, sem arritmias, onde nada risca e faz mossa e corações de
plasticina que se moldam às formas dos corações que amam. Há corações de papel,
bonitos e frágeis que se amachucam facilmente e desbotam à primeira lágrima, há
corações de vidro que quando se estilhaçam nunca mais se recompõem e corações
de porcelana que depois de se partirem ainda sabem colar os destroços e começar
de novo.Há corações orientais, espiritualizados e serenos e corações ocidentais
hedonistas e ambiciosos, corações britânicos onde tudo é meticulosamente
arrumado segundo costumes e convenções, latinos que batem ao som da paixão e da
loucura.
Há corações de
uma só porta que são como grandes casas de família e outros de duas portas, uma
para a sociedade e outra para a intimidade. Há corações que são como conventos,
silenciosos e enclausurados e outros que são como hotéis, onde se paga o amor
sem amor, escandalosos e promiscuos. Há corações parasitas, que vivem do afecto
dos outros sem nada dar e corações dadores que só são felizes na entrega.
Mas há ainda uma
ou outra espécie de corações, os corações hospedeiros que sabem receber e fazem
sentir os outros corações como se estivessem em casa, que dão e aceitam amor
sem se fixarem, que tratam cada passageiro como se fosse o último, enquanto
procuram o coração gémeo, sempre na esperança, secreta e nunca perdida de um
dia deixarem de viajar e sossegarem para a vida."
(M. Rebelo Pinto)
(M. Rebelo Pinto)
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