sábado, abril 30, 2011

UM LUGAR DO EDEN - Quinta da Regaleira






A história da Quinta da Regaleira, hoje Casa Museu Quinta da Regaleira e património da Unesco, remete-nos a 1697, quando José Leite era dono e senhor de uma vasta propriedade nos arrebaldes da serra de Sintra, perto da Vila de Sintra. Cerca de dois séculos mais tarde, por volta de 1892, os barões da Regaleira,  donos à época desta propriedade, venderam esta herdade a António Augusto Carvalho Monteiro, conhecido pela alcunha de o "Monteiro dos Milhões", pela quantia de 25 contos de réis.
Mapa da Quinta
A - Entrada dos Guardiães e Terraço Celeste.
B - Poço iniciático, uma galeria subterrânea em espiral, por
onde se descem nove patamares até às profundezas da terra.
C - Capela da Santíssima Trindade, com uma riquissima
fachada.
D - Lago dos Cisnes e Banco 515, na Gruta da Catedral.
E - Torre da Regaleira, construída para dar a quem sobe a
ilusão de se encontrar no eixo do mundo

Nascido no Brasil, herdou de seus pais, emigrantes afortunados pelas benesses do café, da borracha e de pedras preciosas, uma enorme fortuna. Muito novo, embarcou para Portugal para estudar, licenciando-se em leis pela Universidade de Coimbra. Fez-se um homem de grande cultura, muito bom conhecedor das artes mais ou menos esotéricas, tornou-se também coleccionador e foi-lhe atribuída a posse da maior colecção camoniana jamais reunida em Portugal, ao tempo.

Altruísta e excêntrico, contratou e influenciou o arquitecto italiano Luigi Manini a quem encomendou o que hoje se pode observar: luxuriantes jardins, lagos, grutas e construções enigmáticas que ocultam significados alquímicos. Vários hectares, cheios de simbologia isotérica, de braço dado com estilos que vão do Romântico, Gótico, ao Renascentista e Manuelino, sentindo-se também muita influência Maçónica, Templária e Rosa-Cruz. Enfim, um lugar todo ele mágico, único no género em todo o mundo, aqui à nossa beira, no Monte da Lua, designação esotérica dada à serra de Sintra.

Escultura  do Patamar dos Deuses

Cinquenta anos mais tarde, já com as características actuais, a quinta foi vendida a Waldemar d'Orey que, por sua vez, em 1987, a voltou a vender a uma empresa japonesa Aoki Corporation, que manteve esta propriedade inactiva por um período de dez anos. Em 1997, e depois de Sintra ter sido classificada Património Mundial, pela UNESCO em 2002, a Câmara Municipal adquiriu este valioso património, fez-lhe exaustivas obras de recuperação, findas as quais a quinta foi finalmente aberta ao público, como centro de actividades culturais.

A visita a todo este universo começa junto ao chamado Patamar dos Deuses, terraço onde estátuas de vários seres divinos estão alinhadas ao longo do caminho. Daqui parte-se para uma visita ao interior dos jardins onde a cada momento o visitante é surpreendido por lagos, fontes, torres, terraços, grutas e muito elementos simbólicos.

Românticos de concepção, os Jardins da Regaleira são constituídos por uma mistura de plantas e árvores, trazidas das mais variadas partes do globo: o passeio pelos jardins e pelo bosque faz-se  quase exclusivamente por caminhos de ascensão. A certa altura do percurso surge, num dos lugares mais bonitos da mata, um aglomerado de pedras  que esconde uma porta de pedra, disfarçada. Essa porta transporta-nos para um dos lugares mais impressionantes da quinta - o fantástico poço iniciático, que, como se fosse uma torre invertida, nos leva ao interior da terra.

Poço iniciático

De quinze em quinze degraus descem-se os nove patamares circulares do poço, recriando o ritual em que se descia ao abismo da terra ou se subia em direcção ao céu, consoante a natureza do percurso iniciático escolhido. Os nove patamares aludem aos nove círculos do Inferno, às nove secções do Purgatório e aos nove céus do Paraíso, que Dante consagrou na Divina Comédia. Lá no fundo, a carga dramática acentua-se.

Gravada em embutidos de mármore em tons rosa, sobressai a grande cruz da ordem dos Templários, aliada a uma estrela de oito pontas, afinal o emblema heráldico de Carvalho Monteiro. É neste último patamar que entramos num conjunto de grutas que nos conduzem ao exterior, em autênticos labirintos, pelo mundo subterrâneo, aqui e além porventura povoado de morcegos. De construção artificial, na sua maioria, estas galerias aproveitam, no entanto, as características geológicas da mancha granítica da serra de Sintra. Uma vez cá fora, espera-nos a luz e um cenário habitado por animais fantásticos, cascatas de água e passagens de pedra que parecem flutuar à superfície dos lagos.

Lago da Cascata

Depois desta experiência tão marcante misticamente, o passeio continua, cada vez mais deslumbrante até chegar à Capela da Santíssima Trindade. Com uma única nave, este templo segue a mesma linha decorativa que reveste o palácio, assentando, sobretudo no revivalismo do gótico e do manuelino. Foi aqui que, durante alguns dias, repousaram os restos mortais do próprio Carvalho Monteiro, em câmara ardente, quando do seu falecimento.

Mas a Capela revela uma outra surpresa, escondida de olhares menos atentos: umas escadas estreitas situadas à entrada do lado direito, descem em espiral até à cripta. Trata-se, na verdade, de outro templo, de decoração despojada, com pavimento revestido de mosaico, em xadres preto e branco, completamente mergulhado na escuridão, propício à meditação e à comunhão com os mortos.

Capela da Santíssima Trindade

Muito perto e um pouco mais acima, encontra-se finalmente o palácio, de onde se tem uma vista soberba do vale onde se estendem os jardins, da serra e do Palácio da Pena. O monograma de Carvalho Monteiro destaca-se na fachada do edifício, todo ele ligado por cordas, nós, laçadas e frisos, num manifesto recurso ao uso do estilo manuelino.

A arte gótica convida-nos a olhar para cima: o edifício desafia as leis da gravidade, e prolonga-se em direcção ao céu, numa sucessão de capitéis, gárgulas e pináculos ogivais, muitos deles quase imperceptíveis.

Torre da Regaleira














A visita a esta estranha quinta, tão intrigante como maravilhosa, termina no interior do palácio onde se destaca o lindíssimo pavimento polícromo de mosaico veneziano.


Riquíssimo nos seus ornamentos, este palácio actualmente alberga exposições das mais variadas formas de arte.



Quando a visita termina, fica-nos a sensação de que ainda teremos que voltar, porque algo ficou por ver...











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