quinta-feira, junho 14, 2012

MALUDA (1934-1999) - Uma Pintora Que Amou Lisboa...












Ainda na sequência da quadra festiva que Lisboa vive, com as festas dos seus Santos Populares, achei que tinha toda a lógica  evocar, numa singela homenagem, o nome de uma pintora que, não tendo nascido nesta nossa capital, todavia amou-a como poucos e soube, na sua vivência, absorver e transmitir a alma lisboeta na sua mais verdadeira essência. Maluda. Um tanto afastada, talvez mesmo algo abandonada...

Maluda, fotografada pelo fotógrafo Eduardo Cabrita

A noite lisboeta atraía Maluda. O Botequim, que frequentava com Natália Correia (escritora e poetisa), era o seu poiso noturno,  onde as tertúlias duravam, muitas vezes, até às tantas da madrugada. Os seus maiores amigos foram Amália Rodrigues, Natália Correia e Marco Paulo. Apesar de solitária, vivendo só por opção de vida conscientemente assumida, Maluda ajudou a avivar o mito do artista boémio, uma velha tradição da Lisboa burguesa, dos tempos de Almada Negreiros e Fernando Pessoa.

Maluda dizia: "Não acredito na pintura de ocasião, de inspiração. A pintura é trabalho, a arte dá trabalho", acrescentava. Por isso pintava todos os dias religiosamente, como um emprego. De preferência à tarde, quando as cores eram mais puras, mais filtradas.

Francisco de Sá Carneiro - por Maluda

Como confessou numa entrevista, " a atmosfera fica mais calma, as cores mais filtradas, tudo é mais ameno e bonito". A geometria das formas é uma das características fundamentais da pintura de Maluda. O mundo de Maluda não era o preto e branco e isso é bem visível na sua obra onde a cor, os tons claros e os contrastes assumem importância primordial.

Maria de Lurdes Ribeiro, Maluda, nasceu na cidade de Pangim, em Goa, no então Estado Português da Índia, a 15 de novembro de 1934. Viveu desde 1948 em Lourenço Marques (atual Maputo), onde começou a pintar e onde formou, com mais quatro pintores, o grupo que se intitulou "Os Independentes", que expôs coletivamente em 1961, 1962 e 1963. Em 1963 obteve uma bolsa de estudos da Fundação Calouste Gulbenkian e viajou para Portugal, onde trabalhou com o mestre Roberto de Araújo em Lisboa. Entre 1964 e 1967 viveu em Paris, bolseira da Gulbenkian. Aí trabalhou na Académie de la Grande Chaumière com os mestres Jean Aujame e Michel Rodde.

Foi nesta altura que se interessou pelo retrato e composições que fazem a síntese da paisagem urbana, com uma paleta de cores muito característica e uma utilização brilhante da luz, que conferem às suas obras uma identidade muito própria e inconfundível.

Maluda, auto-retrato

Depois da sua primeira exposição individual na galeria do Diário de Notícias, em 1973 realizou uma grande exposição individual na Fundação Gulbenkian, que obteve grande sucesso e lhe deu grande notoriedade. A partir de então, tornou-se numa das pintoras mais famosas do século XX. Três anos depois, e durante mais dois anos foi novamente bolseira da Fundação Gulbenkian, estudando em Londres e na Suíça. A partir de 1978 dedicou-se também à temática das janelas, procurando utilizá-las como metáfora da composição publico-privada.

No ano seguinte recebeu o "Prémio da Pintura" da Academia Nacional de Belas Artes de Lisboa. Após nova exposição na Fundação Gulbenkian, E 1985, Maluda foi convidada para fazer várias séries de selos para os CTT. Dois dos selos da sua autoria ganharam, na World Government Stamp Printers Conference, e em Périgueux, França, o "Prémio Mundial" para o melhor selo. Recebeu ainda, em 1994, o prestigiado "Prémio Bordalo Pinheiro" e em 1998 foi agraciada pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, com a Ordem do Infante D. Henrique.

Maluda com o seu irmão Eduardo, em Moçambique

Embora experimentando vários géneros, retratos, serigrafias, tapeçarias, cartazes, painéis murais, ilustrações e selos do correio, o cerne principal da pintura de Maluda está muito voltado para a síntese da paisagem urbana, no que a sua arte, na opinião de alguns, segue conceptualmente Paul Cézanne (1839-1906), o mestre do Impressionismo.

Os quadros que pintava eram baseados principalmente nas cidades, na pintura de paisagens urbanas, janelas e vários outros elementos arquitetónicos. As suas janelas, com pequenas varandas e com paleta de cores bem viva e expressa nos azulejos típicos de Lisboa são disso flagrante exemplo.

Maluda morreu cedo, a 10 de fevereiro de 1999, em condições de sofrimento moral e físico.



Telhados de Lisboa- por  Maluda




Vergílio Ferreira fala dela, discretamente e com ternura, em "Escrever": 


"170. Está sentada numa cadeira de rodas. Tem as pernas cortadas pelos joelhos. E entretanto a morte vai-a trabalhando no que lhe resta ainda vivo... E enquanto o fim não vem, ela pinta. E ri com os amigos. E inventa festins para celebrar com eles a alegria que perdura. Breve talvez tudo acabará. Mas como o apóstolo, ela poderá perguntar: ó morte, onde está a sua vitória? E a morte levá-la-á enfim, mas acabrunhada de vergonha e de silêncio."


Os restos mortais de Maluda repousam no Cemitério dos Prazeres, na sua amada Lisboa. 

Em testamento, a artista instituiu o "Prémio Maluda" que, durante alguns anos, foi atribuído pela Sociedade Nacional de Belas-Artes.










OBRAS DE MALUDA:

À esquerda: 1-2-3-Lisboa; 4- A Romã.  
 À direita: 1-Auto-retrato;2- Janela;3- Amália Rodrigues;4- Janela






"JANELAS" DE MALUDA

POEMA DE ROSA LOBATO FARIA (Poetisa), DEDICADO A MALUDA:



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